Talvez possamos nos inspirar nas palavras
do poeta Carlos Drummond de Andrade
para tentar compreender algumas das questões familiares.
Poema que revela os conflitos que atravessamos no processo
de aceitação familiar e individuação.
Fim da casa paterna
"Vou dobrar-me à regra nova de viver
ser outro que não eu,
até agora musicalmente agasalhado
na voz de minha mãe, que cura doenças,
escorado no bronze de meu pai, que afasta os raios.
Ou vou ser menos, talvez isso,
apenas eu, unicamente eu,
a revelar-me na sozinha aventura em terra estranha?
Agora me retalha o canivete desta descoberta:
eu não quero ser eu, prefiro continuar objeto de família."
É impressionante a influência decisiva da família sobre o bem-estar de uma pessoa. E o mais impressionante é o discurso das pessoas pelo desejo de autonomia em relação às suas famílias. Ou seja, um grande desejo de ser original, mas ao mesmo tempo preso à lealdade familiar de ser igual.
Como o ser humano precisa pertencer!
Primeiro a um grupo familiar, depois a um grupo social, religioso, profissional, etc.
A verdade é que o ser humano é um ser de relação, sendo parte de uma longa cadeia de interações familiares que se estende no sentido longitudinal (histórico) e transversal (presente). Assim, muitas das coisas que vivemos no presente são repetições das histórias do nosso passado familiar. Pertencemos à determinada família quando reconhecemos em nós, as mesmas histórias, crenças, dogmas, tabus e mitos.
Mas tudo isso, também é um paradoxo bastante interessante, porque os membros individuais de uma família raramente experimentam-se como parte integrante dela. Acreditam que são diferentes de seus pais, de seus avós, bisavós. Pensam que são originais, diferentes, individuados. Mas na maioria dos casos, são cópias de sua família e do seu grupo social e cultural.
Difícil mesmo é ser diferente, individuado.
Pertencer e não pertencer.
Parecer e não parecer.
Para deixarmos de sermos cópias e nos tornarmos indivíduos diferenciados das regras familiares, dos mitos, dos segredos, das loucuras e doenças familiares precisamos conhecer, reconhecer e aceitar as nossas raízes.
Através da metáfora da árvore, representamos uma família.
As raízes representando a família ampla; o tronco representando a família de origem; os galhos e ramos representando a família atual.
O genossociograma – uma árvore genealógica comentada – informa sobre seus membros e suas relações em três gerações no mínimo. Destacamos os fatos, suas repetições, suas exceções, seu padrão interacional, o que vai permitir uma visão melhor dessa família.
Dessa forma, somos capazes de ordenar fatos, acompanhar os movimentos de mudança, perceber os ciclos vitais e suas passagens. E quanto mais conhecermos as histórias familiares, mais ampliamos nossa CONSCIÊNCIA e assim, podemos nos tornar livres para fazer novas escolhas, novos caminhos ainda não trilhados e percorridos.
Em minha prática de consultório, integrei algumas terapias de abordagem transgeracional, como a Psicogenealogia, com o uso do genossociograma e átomo social, somado ao uso de recursos da Psicoterapia Sistêmica (genograma, genograma metafórico, genograma fotográfico), das Constelações Familiares e da Psicologia Arquetípica e Imaginal (imagens e sonhos). Assim, “batizei” esta minha prática, como Psicogenealogia Sistêmica Aplicada.
Posso então dizer que, a Psicogenealogia Sistêmica Aplicada é um trabalho que enfoca a família e a herança transgeracional, questionando as crenças arraigadas, ao mesmo tempo, aceitando as figuras míticas dos antepassados (heróis ou bandidos).
Ir além dessas barreiras dos mitos e dos segredos estabelecidos nas famílias, devolver a seus membros a possibilidade de aceitarem e também traçarem e responderem por novos destinos é uma das tarefas do psicogenealogista sistêmico.
Texto escrito por:
Jaqueline Cássia de Oliveira
Psicóloga - CRP 04/7521
Psicoterapeuta Familiar Sistêmica (Brasil)
Formação em Psicogenealogia (Itália)